As 3 principais influências determinantes para o Brasil no próximo período pós-pandemia

1. A influência geopolítica, estrangeira. As eleições presidenciais nos EUA deste ano, que podem afastar Donald Trump, os neocons e o tea party republicano do poder federal, terá tanta importância quanto as eleições brasileiras municipais, em que frentes de esquerda contra o atual desgoverno podem surgir a partir de cidades-chaves. Sem Trump, sabemos que o pilantra do Planalto e seu desgoverno militarizado, subserviente, capacho isola-se ainda mais e não “fica bem das pernas” interna e externamente. O resto do mundo polido estranha ou detesta o atual inquilino do Planalto; mesmo os capitalistas internos, dependentes e ruins, preferem adular apenas o terraplanista econômico Paulo Guedes, um Bolsonaro com Phd, porque os engorda e sustenta. Outra influência geopolítica determinante para a próxima década: o papel global de um bebê da produção em larga escala, a China, principal parceiro comercial do Brasil, enquanto se deterioram o dólar, o PIB e o banditismo global dos Estados Unidos, onde também a fome¹ e o desemprego aumentam. (Infelizmente, não temos ainda um governo decente que pudesse, nesse momento crítico, desesperador e crepuscular para os EUA, jogar com as contradições, reunir Venezuela e a América Latina integrada, Rússia, China, África árabe e África negra para quebrar a potência hegemônica, criando uma nova moeda, por exemplo, e fortalecendo a militância socialista daquele país².) Nesse aspecto, embora a vitória de um liberal como Joe Biden aparentemente traga alguns benefícios imediatos ao Brasil e ao mundo, o seu low profile de Democrata, sem os preconceitos explícitos de Trump, apresenta maior competência para perpetuar o hegemonismo daquele país…

2. A reorganização do Estado, agora e no próximo período. A pandemia e a crise econômica que já lhe vinha antes obrigaram aos governantes uma reorganização do Estado burguês. Aos trancos e barrancos, o neoliberalismo foi golpeado em várias frentes. O terraplanismo ultraneoliberal de um Paulo Guedes – sujeito que aparece em lives com sua estante deserta (exemplo único no mundo!), vazia como sua cabeça – foi enxugado ou, em certos projetos, colocado de lado pelo Congresso. Países como a Espanha estatizaram hospitais privados, em que a saúde virava mercadoria para poucos. Sabemos que a solução vai além – é preciso socializar a indústria farmacêutica nas mãos dos trabalhadores. A saúde social e pública durante a pandemia do novo coronavírus mostrou a sua importância vital, provando a olhos vistos para quem se negava a ver que o capitalismo não dá conta do problema, e que, aliás, a única lógica do capital, diante de riscos de vida e diante de milhares de óbitos, é o lucro. Capitalismo é miséria, é exploração, é espoliação, é concentração de riqueza, é pobreza, é falta de qualidade de existência em todas as áreas. O desgoverno Bolsonaro destruiu, em menos de 2 anos, os ministérios da Saúde e da Educação e danou todos os outros, corrompe a todo o momento a frágil Constituição de 1988, mas absolutamente todos viram, até mesmo aqui, que trata-se de Estado social ou barbárie e morte. Mais do que isso, praticamente todos os países investiram num auxílio emergencial ou numa renda básica para a população durante o distanciamento físico. As esquerdas parlamentares foram protagonistas nessa conquista. Falou-se, na imprensa, em “keynesianismo”… Também voltou à baila a discussão da taxação de bilionários desprezíveis que aumentam sua fortuna em plena pandemia, enquanto os salários dos trabalhadores abaixam ou o desemprego explode em face de empresas e indústrias que fecham durante a crise capitalista e a pandemia. Nós, comunistas, sabemos que ambas as propostas da social-democracia – renda básica universal e taxação de grandes fortunas – varrem a poeira para debaixo do tapete, são lenitivos que resolvem o problema do capital apenas em alguns anos (vide a Europa), mas nos importa monitorar o seguinte: O que a direitalha – tanto a eleitoreira-populista quanto a burocrática da economia vulgar – faz e fará a respeito dessa nova reorganização do Estado para a sua manutenção do capitalismo moribundo? E as esquerdas?

3. O embate político nacional, fruto das lutas de classes (aqueles que não estudam teoria chamam vulgar e equivocadamente de “polarização”), permanente nas redes sociais e pronto para respingar nas ruas, entre fascistóides ou a direitalha no geral e a esquerda progressista, que sofreu diversas derrotas nos últimos quatro anos e que precisa (re)construir o seu retorno – dentro e fora do poder político – a partir da desmobilização generalizada, sem ainda forte liderança orgânica, e também de novas sendas de oportunidades populares (protestos antifascistas, a organização dos entregadores de aplicativos, das mulheres e suas causas, a necessidade de um renovador radicalismo comunista pela grande política³, etc.).

 

1. A fome avança nos EUA há décadas, provando que o capitalismo e a propriedade privada dos meios de produção nunca funcionaram. Cf., por exemplo, dois estudos deste vigente ano de 2020: pesquisa do Brookings Institution, revelando que a fome nos EUA já ultrapassa níveis da crise capitalista de 2008 (uma em cada cinco casas dos Estados Unidos com crianças com menos de 12 anos possui insegurança alimentar), e estudo da Household Pulse Survey, registrando que cerca ou mais de 30 milhões não têm o que comer naquele país.

2. Eu tenho estabelecido contato com jovens dos EUA que pretendem criar um novo movimento comunista no seio do “capitalismo desenvolvido”, mas internacionalista, é claro. Já participei também de reuniões online da Liga Internacional Socialista com membros dos 4 cantos do globo, e sempre há um representante dos EUA. Trump tem atacado o socialismo justamente porque o socialismo tem crescido nos EUA. A campanha presidencial de Bernie Sanders não passou de uma representação de organizações populares, ainda que pequenas (não se comparam, por exemplo, ao tamanho dos movimentos sociais do Brasil), e de toda uma geração que, insatisfeita com o fracasso das políticas capitalistas, pela primeira vez na história daquele país pode ler a bibliografia marxista sem cair na narrativa anticomunista dos pais, da TV, das escolas, da perseguição e censura maccartistas, etc.

3. Antonio Gramsci diferenciava a pequena política da grande política. A pequena política gira em torno dos pequenos elementos da conjuntura, das intrigas parlamentares, dos corredores das instituições, do “dia a dia”, das pequenas ambições, dos interesses particulares, muitas vezes superdimensionados pelas redes sociais, imprensa e TV. A grande política, estrutural, está associada a uma grande ambição, inevitavelmente ligada ao bem coletivo, e que visa manter ou destruir ou transformar o Estado, a política, a sociedade, a economia vigentes.

4 de agosto de 2020